terça-feira, fevereiro 28

Do Caio, mas poderia ser meu.

‎''Ontem chorei. Por tudo que fomos. Por tudo o que não conseguimos ser. Por tudo que se perdeu. Por termos nos perdido. Pelo que queríamos que fosse e não foi. Pela renúncia. Por valores não dados. Por erros cometidos. Acertos não comemorados. Palavras dissipadas.Versos brancos. Chorei pela guerra cotidiana. Pelas tentativas de sobrevivência. Pelos apelos de paz não atendidos. Pelo amor derramado. Pelo amor ofendido e aprisionado. Pelo amor perdido. Pelo respeito empoeirado em cima da estante. Pelo carinho esquecido junto das cartas envelhecidas no guarda- roupa. Pelos sonhos desafinados, estremecidos e adiados. Pela culpa. Toda a culpa. Minha. Sua. Nossa culpa. Por tudo que foi e voou. E não volta mais, pois que hoje é já outro dia. Chorei...''

Caio Fernando Abreu

quinta-feira, agosto 11

Grito mudo e isolado

O telefone que não toca. Me falta a calma que te sobra. Depois, ensaio um sorriso e finjo estar tudo bem. Tudo para não atrapalhar o riso dos olhos puxados. Pensei: se é para não desatar os laços que doem, eu desamarro os nós. Jogo, ao vento, as folhas secas, os galhos, os espinhos. Agora, sou só torcida para que o coração não traga o que a cabeça insiste em deixar pra lá.

Desabafo

A chama acesa do teu cigarro bêbado queimou o riso que me era tão leve há tanto tempo. Mas, de ti, não guardo raiva, não guardo rancor. Não guardo nada teu. A dor, essa é minha e, como todas as outras, passará.

Sobre ir e levar a tua dor

Tu és cruel, garota. Chega e aponta o dedo, magoa a ferida, entra não é bem vinda e se faz em casa onde não és. Tu és insensível, garota. Ignora os ocorridos, o sentido. Pega o espelho e veja o reflexo do teu egoísmo, garota. Tu és falsa, fingida, traíra e leva a perder o que nunca saberias estimar. Tu és fria, chata, boba e desajuda o amor. E, quem desajuda o amor, garota, contraria a própria vida, seca o ar. Vai-te, garota, vai-te que nada de bom tu me trazes.

terça-feira, novembro 23

a coisa mais triste é quando chega a hora de ir dormir e levamos pra cama o nada feito, o abraço ausente, o tempo passado e o aperto no peito.


quinta-feira, novembro 11

trapezista

Era uma vez, mas eu me lembro como se fosse agora. Eu queria ser trapezista, minha paixão era o trapézio. Me atirava do alto na certeza que alguém segurava-me as mãos não me deixando cair. Era lindo mas eu morria de medo, tinha medo de tudo quase: cinema, parque de diversão, de circo, ciganos, aquela gente encostada que chegava e seguia. Era disso que eu tinha medo. Do que não ficava pra sempre.

Era outra vez outro parque, outro circo, ciganos e patinadores. O circo chegou na cidade, era uma tarde de sonhos e eu corri até lá. Os artistas se preparavam nos bastidores para começar o espetáculo e eu entrei no meio deles e falei que queria ser trapezista. Veio falar comigo uma moça do circo que era a domadora, era uma moça bonita, mas era uma moça forte, era uma moçona mesmo. Me olhou, riu um pouco e disse que era muito difícil mas que nada era impossível. Depois veio o palhaço Polly, veio o Topsy, veio Diderlang que parecia um príncipe, o dono do circo, as crianças, o público... De repente apareceu uma luz lá no alto e todo mundo ficou olhando, a lona do circo tinha sumido e o que eu via era a estrela Dalva no céu aberto.
Quando eu cansei de ficar olhando pro alto e fui olhar pras pessoas, só aí eu vi que estava sozinha.

Texto de Antônio Bivar
Extraído do Disco Drama 3°Ato - 1973

quinta-feira, outubro 21

Vergonha alheia

Em sala de aula, todos discutiam a política. Serra não, mamãe. Dilma sim, claro que sim. Ao que a imbecil (desculpem, não há outro nome para ela) diz:

- Não voto na Dilma porque o Lula fez uma coisa péssima, que foi permitir que a classe pobre melhorasse de vida. Agora, todos têm roupas iguais às nossas.

A sala se calou em um constrangimento coletivo.

segunda-feira, agosto 16

meus olhinhos, nosso aperto.

São aquelas palavras em chamas vindas de uma boca sem coração. A dor é o que fica no meu peito, doida pra sair, pra virar ação e acabar com a minha expectativa de curar de leve as feridas do peito apertado... machuca a memória pensar nelas - as feridas - como tatuagem e foi você, sim, quem a imprimiu como ela é. E pra razão, assim, como se os meus sentimentos bons estivessem protegidos dos seus ruins. Dentro do peito pequeno falta espaço pra caber a mancha grande que vem de você - ou mesmo vontade, se no mundo das vinganças tudo se corrói... E a brasa do seu nome, acesa como aquilo que passou e doeu, faísca os arrependimentos constantes de um dia contigo ter cruzado, certos de que você só trouxe dor e nada mais.

domingo, maio 23

Mais fácil do que bater de volta, é pedir desculpas no que erra. Se você não sabe, eu sei:
Desculpe querer seu colo, mesmo que aos pedaços. Desculpe te amar a ponto de só você me curar. Desculpe a dor pela sua ausência. Desculpe querer sustentar os juramentos de dedinhos. Desculpe achar que por mim você pararia o mundo e as suas próprias coisas. Desculpe, principalmente, não concordar com o que você chama de desumano. Desculpe, isso não se repetirá, meu bem.

domingo, abril 11

Em que lugar a gente se perde a ponto de não ver mais o monstro no espelho?

Como em um Lego, as peças vão se sobrepondo. Fazendo a torre crescer. Ela cuida para equilibrar, mas as mãos são fraquinhas. Ela não consegue firmar uma peça na outra. Falta força. A torre sobe meio torta. Qualquer vento vai balançar. Qualquer chuva, fazer cair. Mas a torre cresceu com as cores cuidadosamente colocadas uma ao lado da outra. De modo que, ao olhar de longe, dê a cada um uma vontade grande de fazer parte do conto-de-fadas. Tirar a cor seria parar a brincadeira. Se é para sonhar, que seja completo. Ela cuida da forma, cor, disposição e ordem de cada pedaço colocado. Quem vê de fora, não entende. Nem nunca entenderá...

Há monstros, bruxas, gnomos, príncipes e princesas em torno da sua história que só fechando os olhos para conseguir entender...

'nem sempre é so easy'

Há horas em que tudo vai mal. Ninguém te escuta e, se o faz, não entende. Te culpam por sofrer, querem arrancar as últimas migalhas que te restam. Te fazem sombra. Não que o mundo seja um arco-íris. Ele não é. Mas não precisa refletir o lado podre da sua pior parte. Os dias amanhecem, mas as coisas somam. Uma bela tarde de chuva de domingo te vomita certas palavras, que não foram digeridas, entendidas, engolidas. E não importa o quão forte você seja. Elas doem. Não importa o quão fraco você esteja, elas chegam. A vida bate forte, mas te rodeia de pessoas. O problema é que há barulho demais para que elas possam ouvir qualquer coisa. O pedido de socorro fala baixo e com fantasias e o caos não o faz ser compreendido. Não importa o tapa, o importante é seguir. É limpar a ferida, colocar um curativo, esperar fechar e torcer pra não ficar cicatriz. Depois disso, basta seguir.

domingo, março 14

Chamado

Chega com olhinhos espremidos por conta do sorriso largo, chega.

Som de S e P de pontada

Passa, passado.
Passarinho quer voar.
Posso, podes, podemos passar.
Passemos.
Passa, como tudo,
Passaria, passarão.
Passagem, passarela, passeando por aí.
Passa, tudo passa.
Até uva passa.
Só não passa o passado que persegue sem parar.

quarta-feira, fevereiro 10

Desculpe pelos excessos.

Eu te amo fundo e você reclama. Prefere que confundamos os nossos corpos, mas reclama se misturo as nossas vidas, as nossas coisas. Te incomoda os meus excessos de amor, o meu olhar e jeito de ser sua e te querer só pra mim. Desculpe. Me prometi, um dia, viver profundamente. Eu te mostrei quem sou e me dei pra você. Dei meus erros e acertos, mas mais do que tudo dei as minhas tentativas. Se dou um passo penso se era o que você gostaria. Se fico quieta, temo pecar por faltar. Não. Nunca mais essa dor pelo que não foi feito. Prefiro fazer, dar, doar, entregar. Mesmo que doa. Desculpe se ao aparecer pra ti te tirei espaços, pessoas. Entre os meus abraços sempre esteve um pedido de socorro e aceitação. Muita sede faz derramar a água. Desculpe se não fui aceita por todos que lhe rodeavam. Não me importo e nem espero por. Ser aceita por ti me basta. É meu jeito assim de amar, meio torto, muitos "muito", desencontrados. Só sei assim. Eu que sempre fui livre não importava o que ninguém falasse. Agora me vejo pensando e perguntando até onde eu posso ir por ti, pra ti? Você reclama como se houvesse um botão pra eu reinventar o silêncio do dito e pra passar uma borracha no que foi feito. Desculpe se te amo profundamente a ponto de desnudar e desconcertar. Eu não vou separar os meus erros dos meus acertos. Sou a soma deles. Muito menos separarei os seus. Me deixa sentir, me deixa falar. Desculpe se você nunca teve pedidos do tipo, não sei. Mas sei que você nunca teve alguém que te amou tanto quanto eu amo. Só quem se mostra totalmente se acha no amor, por mais que se perca certas horas. Eu sou assim: errante, suja, pequena, boba, intensa, exagerada. Mas cheia de amor. Sempre. Uma metade e a outra também. Amor pra ti.

quinta-feira, outubro 22

João.

Há muito pra fazer e há tanto pra brincar,
mas o tempo espera.
Dorme, meu amor, que é cedo ainda.
Há castelos, bolas e bonecos,
sim, a vida é doce.
Dorme, pequenino, dorme pra nos fazer sonhar.
Ja já, aprontaremos em qualquer faz-de-conta,
da vida ou dos palcos.
De tudo o que esperamos,
você foi mais:
a obra de arte mais linda já vista;
a luz mais colorida da estreia.
E esses olhos que trazem o azul do céu e mar,
recebem uma canção que te nina, João.
Nina pra te fazer sonhar
e sorrir enquanto dorme.
E te olhar assim,
tão grande e tão pequenino,
na nossa frente,
faz o bem que só a paz faz.

Bem vindo ao mundo.

domingo, outubro 18

o que fica depois do vendaval.

De tudo, fica a lição que é hora de quietude. Calar o peito faz o riso (os risos) voltar (voltarem). Se em coro ou não, só o tempo diz. Sei calar e quando o faço, é pra valer. De tudo, vejo que se temos boca pra falar é porque a comunicação funciona melhor do que quando com os dedos. Bem que me falaram para desconfiar dos e-mails... só Deus sabe por quais caminhos aquelas palavrinhas passam enquanto percorrem os fios: elas saem de um lugar com doçura e são recebidas com rispidez (não importa se é de Norte a Sul ou se é o oposto). E, ainda assim, elas não te dão o direito a teclar um delete e começar tudo de novo, a fazer diferente e falar de outra forma, cuidando do tom para que você consiga ser clara. De tudo, ficam as palavras a rondar a cabeça. Não as palavras tidas como esclarecedoras, mas aquelas colocadas como explicativas que, não tenho dúvidas, são as mais sinceras: "não é nada disso", "não quis dizer isso", "não, não, não", "eu pensei errado"... De tudo, ficam, agora, as cicatrizes, os silêncios e os desejos que tudo fique bem.


[De tudo, fica um sentimento, um aperto e um nó que tá cá na goela, que se nota como tal, mas que, simplesmente, não sai mais. Não por não querer, mas por não saber. Fica o nó de aperto e dor pelo carinho não dito, pela explicação mal colocada e pelo sentimento reprimido.]

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É uma pausa maior, que faz parar um pouquinho mais. Muitas vezes indica que é hora de mudar o tema, as palavras, o assunto. Mas, nem sempre, é um fim. E é aí que tá a sua forte delicadeza: no poder tamanho que um ponto tem. Gosto deles, ainda mais que das vírgulas. Não por terminar tudo, mas por carregar o maniqueísmo que só ele saberia.

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Ela nasce quando a mão dá uma escorregadinha no papel a fim de informar que ali é a hora de parar, respirar, refletir para, então seguir.
Gosto da danada da vírgula que consegue dar a velocidade adequada ao percurso mostrando que, do menor bilhete ao maior romance, é preciso
parar, respirar, refletir para, então, seguir.

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Falam muito do meu sorriso. Não sei se por ele ser constante ou aberto demais. Ele, de fato, é meio frouxo e expansivo. Mas falso, nunca. Sou, como todos, a soma de tudo que vivi e, após levantar dos tropeços e dores (que não foram poucas pros vinte e poucos que carrego), pude sentir o quão importante é sempre manter a mente quieta e o coração tranquilo. Falo, muitas vezes, com riso no rosto e cara lavada e é disso que gosto. Quando não, me fecho e me envolvo no meu mundo branco e preto - o que quebra a imagem que muitos constroem de mim e faz com que me vejam como expansiva, abertinha, fútil e superficial -. Intensidade talvez seja o meu mal. Eu rio e choro demais por muito pouco. E eu gosto. A indiferença passa longe, o que às vezes faz doer mais do que o necessário. Nunca aprendi a ligar o "foda-se". E nem quero. Penso eu, com meus poucos vinte, que carregar no corpo as marcas do caminho (com os risos e lágrimas, com as luzes e sombras, com o bom e o ruim) faz com que você melhore. Isso só não pode pesar. Eu não consigo deixar que nada passe despercebido e sei que passo despercebida por muita coisa. Mas, também, consigo que pouquíssima coisa me tire a leveza do vento que me conduz. E ser assim, um pouco desprendida de qualquer manual de instrução e sentindo mais o frio na barriga do que muitos, me faz entrar em um contexto de construção e desconstrução contínua para muitos. Pois sei que muitas vezes faço algo que faz parecer uma coisa, mas que foi outra. Eu não faço questão de provar quem sou e muito menos que preciso provar nada pra ninguém, mas o riso cala quando não deveria só por andar de mãos dadas com um coração que sente demais.

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Ao contrário de Clarice, não estou cansada, só estou triste. É um aperto que vem do sufoco de se saber incompreendida ou da terrível frustração que sinto comigo mesma sempre que erro. Não lido bem com o pensamento que eu não me fiz entender. O resultado é esse: eu olhar pro espelho e enxergar o peito espremer até chegar uma hora e um dado instante em que não dá mais pra saber o que é. Eu e meus por quês a me inquietar. Eu sei que não adianta buscar respostas, pois elas virão na hora certa. E, no fundo no fundo, eu sei que não é nada.

(talvez isso piore tudo: o nada a incomodar. por nada)